Não resisti à publicação deste texto sobre gerundismo. Confira!
Uma artigo vai estar falando mal dessa maneira de estar inserindo verbos só pra enrolar os outros.
O novo horror da língua portuguesa é a invasão dos gerúndios assassinos. Você já deve ter passado por isso. Alguém ao telefone lhe pede para “estar esperando”, porque vai “estar lhe passando” a informação que você pediu “quando o chefe estiver tendo condições de estar lhe informando” qualquer coisa.
Pior do que ter passado por isso: você já deve ter se surpreendido falando assim.
Não é a primeira vez que se investe contra essa nova forma de expressão. Gramáticos, por exemplo, são puristas por excelência e detestam qualquer desvio na norma culta da língua. Em geral, eles “vão estar detestando” a invasão dos gerúndios.
Já os lingüistas, por natureza muito mais liberais, só prestam atenção à adequação da comunicação. Ou seja: “O recado que você queria dar foi passado ? Então ótimo”. Não, não está ótimo, não. Porque o modo como se passa um recado diz muito sobre a pessoa que o passa.
De onde vêm esses malditos gerúndios? Uma das hipóteses mais fortes é que eles são uma adaptação brasileira da forma ing, do inglês. Americanos são craques em usar e abusar do ing. Se for isso, é uma adaptação equivocada, porque a forma ing não é o equivalente do nosso gerúndio. Ela pode ser gerúndio, mas também particípio e até infinitivo. (Por exemplo : a expressão “I’ll be sitting there” não equivale a “Eu vou estar sentando ali” e sim, “Eu vou estar sentado ali”. “Thanks for coming” , não é, “Obrigado por ter vindo”, mas “Obrigado por vir”.) É por ter estrutura gramatical diferente que o inglês recorre tanto ao ing.
Posto este argumento, precisamos imediatamente desqualificá-lo : mesmo se estiver correto, ele não tem a menor importância. Quando uma língua se apropria de uma forma de expressão de outra, que se dane o que ela quer dizer na outra língua – a forma de expressão passou a ter novo dono, e o novo dono pode fazer o que quiser com ela.
Então, vivam os gerúndios ! Na-na-ni-na-não. Há uma razão muito mais forte para rejeitá-los. E a razão é rejeitar os motivos psicológicos que levam à “gerundização” da língua.
Minha hipótese é a seguinte : o abuso do gerúndio ocorre em situações mais ou menos específicas. Geralmente, quando alguém está tentando nos enrolar. Quando uma pessoa diz “eu vou estar te passando esta informação amanhã”, o que exatamente ela quer dizer? Que vai levar o dia inteiro de amanhã passando e repassando a informação para mim? Que não vai fazer mais nada amanhã, porque estará ocupada me passando a informação? Que vai passar a informação e vai me acompanhar o tempo todo para ter certeza de que eu não a perderei?
Verbos denotam ações. Quanto mais perto do sujeito da frase está o verbo, mais a mensagem denota uma ação deste sujeito. Pode reparar : em situações que requerem objetividade, não há lugar para o abuso dos gerúndios. Você imagina uma assistente dizendo ao cirurgião, na mesa de operação “eu vou estar lhe passando a tesoura”? O gerúndio, que geralmente se interpreta como uma ação que se continua, vem sendo usado para alongar a frase, separando o sujeito do verbo principal.
O português do Brasil já é pródigo em maravilhosas expressões que quebram a rispidez da ação. È uma característica cultural, insistir na relação em vez de frisar a objetividade do ato. Geralmente, isso é feito com a transformação do verbo em substantivo. Por isso, se você vai a uma festa, mas sem muita convicção, você não vai passar, e sim “vai dar uma passada” por lá. Talvéz até “ dar uma passadinha”. Do mesmo modo, você pode dar uma olhada, em vez de olhar, dar um tempo, em vez de mandar a namorada ou o namorado às favas etc.
No caso dos gerúndios, cuidado com eles : você vai estar passando a impressão de enrolador.
David Cohen
disponível em: http://marcio-comunicacaoempresarial.blogspot.com/2007/07/invaso-dos-gerndios-assassinos.html
Olá cataphorenses....
ResponderExcluirOlha só como é muito fácil qualquer um se meter, opinar, justificar e desqualificar quando se trata de assuntos referentes a linguagem. Primeiro é hilário, mas acho que tem algumas coisas que são importantes pela gravidade que elas representam e pelo poder de difusão que tais proposições alcançam...
É interessante pra refletir...o que vocês acham?
É verdade li o artigo quando vc me disse, e me pareceu que informalmente o autor discutiu sobre o tema, e acredito que por isso apresenta uma visão equivocada da linguistica "Já os lingüistas, por natureza muito mais liberais, só prestam atenção à adequação da comunicação. Ou seja: 'O recado que você queria dar foi passado ? Então ótimo'" Acredito eu que o cidadão que escreveu deve ter tido um trauma com esse fato linguistico e resolveu se vingar.
ResponderExcluirHoje em dia os blogs comunicam vairas informações inveridicas!
Tem uma parte do artigo que discordo, pois o pensamento do linguista quanto às questões da língua não é visto de tal forma como foi mostrado no texto, houve um certo exagero ou talvez um pouco mais de conhecimento linguístico para tal comentário.
ResponderExcluirMuito se tem discutido ultimamente, nas rodas de debate sobre língua portuguesa, a respeito do gerúndio. Parlamentares, os tradicionais gramáticos, administradores e muitos outros. Para eles, discurso é o mesmo: o gerúndio é um mal que aflige o português e que, dessa forma, torna-se uma deturpação que deve ser erradicada do nosso idioma.
ResponderExcluirUm exemplo desse discurso é esse texto “A invasão dos gerúndios assassinos” de David Cohen. Através de uma argumentação falha e baseada na intuição, Cohen tenta sustentar sua hipótese de que a utilização do gerúndio tem como propósito enrolar o interlocutor.
Apesar de ser um texto que abusa da criatividade, chega ser exagerado (para não dizer hilário) em afirmações tais como “gerúndios assassinos”, “malditos gerúndios” dentre outras. Em outras passagens, simplifica noções muito mais complexas, por exemplo, sobre o que fazem os lingüistas. Muito mais que observarem apenas a adequação dos enunciados, a Lingüística se prende a assuntos bem mais amplos e complexos e o faz de modo sério e fundamentado. Então, acredita-se que, antes de ser leviano em afirmações como esta, é imprescindível que se conheça sobre o que se esta falando.
Cohen aponta como uma das teses mais fortes a respeito do gerúndio a possível imitação que se faz do uso contínuo de verbos no inglês, representado pelo acréscimo do sufixo - ing. Embora desqualifique essa tese, fica patente mais uma vez o empirismo com que trata o assunto. Ora, o gerúndio é um uso natural ao português de Portugal. Assim, nada mais comum que utilizarmos uma construção que já nos é natural para satisfazer uma necessidade comunicativa especifica, haja vista o idioma lusitano ser bem mais próximo do nosso que o inglês.
De fato, o “gerundismo” é uma construção sintática que tem sua origem associada ao campo específico do telemarketing. Por não terem a autoridade necessária para tomada de decisões, a construção “vamos estar resolvendo seu problema” foi uma fórmula astutamente elaborada pelos falantes para evitar comprometimentos ou informações inadequadas e, talvez, possa ter sido utilizado com fins não tão éticos. Não obstante, hoje o uso do gerúndio generalizou-se de tal forma que não se pode mais falar em “enrolacao”, ou mesmo naquele uso primeiro empregado pelo telemarketing. Hoje os falantes, indistintamente (excetuando-se, talvez, é claro, os puritanos), fazem uso do gerúndio.
O gerúndio, então, mais que uma deturpação da língua é resultado do uso efetivo desta e decretos (como já se tentou fazer no Congresso Federal, onde foi censurado o uso do gerúndio em documentos oficiais com a ilusória pretensão de se modificar a situação de morosidade de execução das atividades) ou juízos de valor de gramáticos e leigos no assunto não vão modificar essa situação. Além do mais, a língua é parte integrante da cultura e se, suponha-se, a prática de enrolar constitui um traço característico do “jeitinho brasileiro”, a não utilização do gerúndio não modificará essa característica. Seria ilusão achar que não utilizar mais o gerúndio no Congresso Nacional modificaria essa prática de “enrolação” (para fazer uso dos mesmos termos de Cohen) característica daquela instituição.
Logo, mais que emitir juízos de valores sobre assuntos da língua e se tentar prescrever/impor comportamentos lingüísticos, é fundamental respeitar as formas de falar peculiares a cada esfera de atividade humana que, diferentemente de deturpações, são traços que caracterizam os falantes daquele registro.