(http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI4405707-EI8425,00-Progressar.html)
Quinta, 29 de abril de 2010, 08h17
A Folha de S. Paulo (25/04/2010) publica uma carta de leitor que diz, resumidamente: ouve que a nova onda dos candidatos é tuitar; sugere que os eleitores devem ficar espertos, porque os que agora tuitam depois vão desviar, enrolar, roubar, ou seja, "corruptar"; por fim, conclama a identificá-los e deletá-los.
É um texto bem humorado, além de militante da causa da decência, uma das mais difíceis de emplacar. Parêntese: não gosto de falar em corrupção de políticos porque ninguém nasce político, e minha opinião é que político corrupto é um corrupto que se tornou político (talvez porque então tudo fica mais fácil).
Mas meu tema são os verbos, os novos e os inesperados.
Um dia desses, assistindo a um filme legendado, vi a forma "progressaram" - vocês progressaram muito. Não sei quem faz essas traduções. Às vezes, parecem falantes de espanhol que estudaram um pouco de português. Não que isso seja necessariamente ruim, mas, se for um fato, o mercado (o Itamarati?) precisaria se mover de outra forma. Talvez casos assim indiquem quais diretrizes o deputado Aldo Rebelo deveria ter sugerido em seu projeto, em vez de pensar em multas aos usuários de estrangeirismos.
Mas, como disse, meu tema são os verbos. Especificamente, tuitar, corruptar e progressar. O primeiro circula sem qualquer problema. Não sei de ninguém que o ataque por ser novidade ou estrangeirismo. "Tuitar" deriva bem normalmente de "tuit" - com a óbvia adaptação ortográfica.
Os outros verbos são menos comuns: "corruptar" soa como brincadeira, até porque está entre aspas, uma piscada dirigida ao leitor. O que importa é que se trata de um verbo da primeira conjugação (como todos os verbos novos do português), derivado de ou diretamente associado a "corrupto", como para tornar mais clara a relação entre as duas palavras.
Obviamente, "progressar" tem com "progresso" o mesmo tipo de relação que "corruptar" tem com "corrupto". Estas duas formas verbais não existem no sentido de que não são correntes em uma comunidade lingüística, é verdade. Elas permitem acesso à verdadeira gramática de uma língua (são indícios dela), o conjunto de princípios ou regras a partir dos quais os falantes "geram" as formas que proferem. Às vezes, ela é acompanhada pela história "exterior" da língua, que, no frigir dos ovos, conta muito.
A gramática não é o compêndio que diz que certas formas são corretas ou erradas. É a máquina que as gera. Esta máquina é acompanhada pelo olhar atento da "sociedade". Curiosamente, às vezes as formas irregulares são preferidas e as regulares são mandadas para o lixo. Mas elas sempre voltam, especialmente na fala de estrangeiros e de crianças e em textos de tom humorístico.
***
A ISTOÉ 2111, de 28/04/2010, elogia Sacconi por ter tido a coragem de registrar neologismos (por exemplo, "mensalão") em seu dicionário. Ora, a decisão equivale à de um naturalista europeu que catalogasse a jabuticabeira e o papagaio. É uma boa medida de "nossa" mentalidade no trato com a língua.
A matéria também diz que uma língua não para de incorporar novas expressões, devido "a um fenômeno da linguística chamado neologia". É como dizer que a queda das folhas é um fenômeno da botânica. Perdoai-lhes, Senhor!
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